O texto apresentado a seguir, de autoria da professora e pesquisadora Anita de Sá e Benevides Braga Delmás, versa sobre a história do curso de Licenciatura em Educação Artística.i
A Escola de Belas Artes, com sua história bicentenária de ensino oficial de Arte no Brasil, primeira escola criada com esse fim pelo Decreto Real de 12/08/1816 para ministrar, inicialmente, os cursos de Pintura e Escultura, posteriormente, passou a oferecer os de Gravura e Desenho. A mesma vem se dedicando também à formação de professores desde 1931, quando criou os cursos de magistério autorizados pelo Decreto nº 19.852 de 11/04/31, o mesmo que a fez incorporar-se à Universidade do Rio de Janeiro, hoje UFRJ, tendo sido reconhecida a sua competência, assim como da Escola de Música, para o preparo de profissionais do ensino.
Tal decreto indicava “como títulos a serem concedidos pela então Universidade do Rio de Janeiro os de professor de Pintura e Escultura e de Professor em Música (Canto e Instrumentos)”. Estes, entretanto, não eram professores com formação destinada ao ensino em escolas regulares.
Alguns anos adiante, em 1943, em parceria com a Faculdade de Filosofia, foi criado o Curso de Formação de Professores Secundários de Desenho, depois transformado em Curso de Professorado de Desenhoii. A Licenciatura em Música foi a transformação direta dos cursos que formavam o professor de canto e instrumentos. (Of. nº3157/82 UFRJ).
Estes, sim, foram os primeiros cursos de formação de professores de Arte para atuar no ensino regular. A Escola de Belas Artes encarregava-se do conteúdo específico, enquanto a Faculdade de Filosofia tratava da formação pedagógica no último ano do curso. Com essa condição, nota-se que a concepção sobre as necessidades para a formação do professor nesta época era bastante reducionista e técnica, quando, apenas um ano era o suficiente para transformar o prático (conhecedor de um determinado assunto) em professor. Tal concepção não era muito diferente da que norteou os cursos de formação de professores que, em algumas áreas, existiram por muito tempo na UFRJ: os cursos de licenciatura no chamado formato “3 + 1”iii.
Todo esse preâmbulo tem o objetivo de mostrar que a Escola de Belas Artes desde 1943iv esteve envolvida com a preocupação de habilitar profissionais para atuar nas escolas brasileiras ministrando disciplinas das áreas de artes e desenho.
Em 1968, foi editada a Lei 5540/68 da chamada reforma universitária, que resultou na transformação do curso de Professorado de Desenho, curso vigente até então, e que apresentava o regime seriado, no curso de Licenciatura em Desenho e Plástica. Para este, o ingresso se dava por um vestibular unificado, apresentado com um novo formato em que incluía um ciclo básico, com duração de quatro períodos comuns também aos bacharelados, e o sistema de créditos.
O curso de Professorado de Desenho, enquanto esteve em vigência, conviveu com os outros cursos de bacharelado oferecidos pela Escola de Belas Artes como os das chamadas “artes base”v – Pintura, Escultura e Gravura – , além das Artes Industriais e das Artes Gráficas. Sua grade curricular era praticada de tal forma que conferia dupla diplomação: o diploma de bacharel pela Escola de Belas Artes e o de licenciado pela Faculdade de Educação.
A diferença entre o curso de Licenciatura em Desenho e Plástica, que se ocupava da formação de professores de Artes e Desenho para atuar nos ensinos de 1º e 2º graus, e os cursos dos chamados formatos 3+1 era o fato de que a sequência de disciplinas pedagógicas já era prevista e não havia conclusão de bacharelado ao fim dos 6 (seis) períodos de disciplinas de conteúdo específico. Isto também ocorria no curso que o antecedeu e em outros cursos que se iniciavam como bacharelado. Ao término da licenciatura havia a manutenção do vínculo para cursar a parte pedagógica na Faculdade de Educação, como ocorria em outros cursos oferecidos pela UFRJ.
Assim, cumpridos os quatro períodos do ciclo básico como qualquer aluno dos cursos da Escola de Belas Artes, os alunos da Licenciatura em Desenho e Plástica cumpriam mais dois períodos de disciplinas exclusivas, antes de se dirigirem à Faculdade de Educação para cursar disciplinas da formação pedagógica e realizar o Estágio Supervisionado no Colégio de Aplicação da UFRJ. Essa sequência era prevista na matriz curricular do curso e, por isso, não havia dupla diplomação, pois o aluno ingressava por vestibular no curso constituído como licenciatura na Escola de Belas Artes e graduava-se pela Faculdade de Educação, sem ter alternativa.
Esse novo curso, implantado em 1971, teve uma vigência que foi menor que uma década – 1971 a 1978 – e participaram dele os alunos que ingressaram por vestibular a partir de 1971, além dos remanescentes do antigo curso que migraram para o novo.
A curta duração do citado curso deveu-se ao fato que, no ano de sua criação, uma nova lei foi promulgada: a Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de 1º e 2º graus, Lei 5.692/71, que promovia uma reforma educacional e criava a “atividade” escolar Educação Artística, englobando as linguagens artísticas desenvolvidas pela Escola de Belas Artes e a Escola de Música e tornando obrigatória a sua presença na Educação Básica, como consta em seu Art. 7º.
Art. 7º Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programa de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de 1º e 2º graus, observado quanto à primeira o disposto no Decreto-lei no 869, de 12 de setembro de 1969.
A inserção da nova “atividade” escolar Educação Artística no ensino de 1º e 2º graus gerou a necessidade da criação de um novo curso de formação de professores de Arte pela UFRJ, resultando na integração compulsória de duas licenciaturas já existentes em unidades acadêmicas dessa universidade: a Escola de Belas Artes e a Escola de Música.
Não sendo mais possível protelar o atendimento à LDB 5692/71, em 1979, quase uma década após a edição desta, foi criado na UFRJ o curso Licenciatura em Educação Artística a partir da proposta formulada pela comissão constituída para este fim, composta de 2 (dois) membros representantes da Escola de Belas Artes, 2 (dois) representantes da Faculdade de Educação e outros 2 (dois), representantes da Escola de Música, unidades responsáveis pelo oferecimento das disciplinas do curso. A criação deste curso acarretou a desativação dos cursos de Licenciatura em Desenho e Plástica, oferecidos pela Escola de Belas Artes, e Licenciatura em Música, oferecido pela Escola de Música, unidades estas da UFRJ responsáveis pela área artística.
Essa comissão, cumprindo as determinações da lei e dos pareceres do CFE que lhe complementavam, construiu uma proposta que tinha por objetivo formar um professor polivalente, capaz de transitar pelas várias linguagens artísticas pertinentes para atuação no 1º grau, atendendo à concepção do currículo escolar por “atividades”, como prescrevia a legislação. Para atuação no 2º grau, ainda de acordo com a legislação, como a concepção do currículo escolar passava a ser por “disciplina”, o curso oferecia a formação desse docente em três habilitações – Artes Plásticas, Desenho e Música. A matriz curricular foi constituída por um elenco de disciplinas comuns às três habilitações com disciplinas de cunho cultural e, em igual porcentagem, com disciplinas especificas das três áreas: Artes Plásticas, Desenho e Música. Cada habilitação também foi constituída por um grupo de disciplinas específicas.
Como duas das três habilitações eram de alunos com matrícula na Escola de Belas Artes, o local para a realização das aulas, incluindo as da Escola de Música e da Faculdade de Educação, era a EBA.
Inicialmente, a subordinação do curso esteve na Faculdade de Educação por esta ser responsável pela formação pedagógica do curso e ser a que tinha o encargo de conceder o título de licenciado aos estudantes. Posteriormente, por iniciativa do Conselho de Coordenação do Centro de Letras e Artesvi, e com a concordância da Faculdade de Educação, foi solicitada a transferência do curso para este Centro, ao qual pertenciam as duas unidades responsáveis pela formação de conteúdo específico, a Escola de Belas Artes e a Escola de Música, em função da vinculação das matrículas dos alunos a tais unidades.
Atendida a solicitação do CLA, tal situação permaneceu até que, por meio do Processo 23079.023142/03-80, a Escola de Música manifestou o interesse em desativar a habilitação Música do referido curso e reativar a antiga Licenciatura em Música. A solicitação desta unidade foi aprovada com novo currículo, e publicada no BUFRJ em 16/07/2003, tendo início, essa nova versão no 2º semestre de 2003 com os alunos da antiga habilitação que optaram pela transferência.
Como consequência da desativação da habilitação Música, não havendo mais razão para que o curso estivesse alocado no Centro de Letras e Artes, pois todos os seus alunos tinham suas matrículas vinculadas à mesma unidade, a Escola de Belas Artes reivindicou para si a subordinação do curso de Licenciatura em Educação Artística, por meio do Processo nº 23079.033528/04-45, que, aprovado pelo CEG e pelo CONSUNI, teve tal decisão publicada no BUFRJ nº 10 de 18/052006.
Desde essa data, o curso esteve alocado na Escola de Belas Artes, e não mais no CLA, especificamente na direção da unidade, o que dificultava a formação de um colegiado direcionado para tratar dos assuntos relacionados ao curso, como ocorre com todos os demais cursos da EBA. As dificuldades geradas por essa alocação levaram o Departamento de Técnicas de Representação a reivindicar o pertencimento do curso ao mesmo, tendo em vista que apesar de ser um departamento chamado “meio”, por oferecer disciplinas a todos os cursos da unidade e não ser responsável, diretamente, por nenhum deles, incumbia-se do oferecimento de todas as disciplinas específicas exclusivas da habilitação Desenho, além de algumas comuns às duas habilitações. Em virtude disso, a partir de 2013, o curso em questão passou a ser alocado no referido departamento, tornando viável o estudo para a reforma de seu currículo pela possibilidade de reunir um colegiado e adequar a reforma do mesmo ao conjunto da legislação pertinente.
Por ter se tornado obsoleta a expressão “Educação Artística”, em virtude da extinção do conceito de polivalência contido na Lei 5692/71, e tendo sido emitida a nova LDB 9394/96 que tratava da obrigatoriedade do ensino da Arte, tornou-se necessária a reforma do curso, com a manutenção das duas habilitações existentes, atendendo à legislação vigente.
A manutenção da habilitação Desenho se justifica para atender à necessidade de formar professores para atuar nas escolas técnicas, militares e escolas privadas que oferecem a disciplina de Desenho Geométrico no ensino fundamental e no ensino médio.
O projeto da reforma do curso, que já vinha sendo pensado há algum tempo, ganhou novo alento com a instituição do Núcleo Docente Estruturante pela Res. CEG 06/2012.
Para a constituição da comissão de professores encarregados de propor a reforma dos currículos dos cursos de Licenciatura da EBA, foram convidados a participar representantes dos departamentos da Escola de Belas Artes, visto que a matriz curricular desse curso é formada por disciplinas oferecidas pelos referidos departamentos. Alguns deles se dispuseram a participar, indicando os nomes dos professores e seus suplentes, o que levou a chefia do departamento BAR ocupada pelo Professor Alvaro José Rodrigues de Lima a solicitar ao Professor Carlos Gonçalves Terra, diretor da EBA, a nomeação dos professores representantes do NDE do curso de Licenciatura em Educação Artística. Tal nomeação se deu por meio da Portaria 10055 de 30/08/2013, publicada no BUFRJ nº 36 em 05/09/2013, com os seguintes professores:
Anita de Sá e Benevides Braga Delmás (BAR presidente e coordenadora do curso na época)
Danusa Chini Gani (BAR)
Michele Salles (BAH)
Martha Werneck de Vasconcelos (BAB)
Marina Pereira de Menezes de Andrade (BAF)
Alexandre Palma da Silva (Dep. Didática - FE)
Claudia Oliveira (BAH suplente)
Licius da Silva Bossolan (BAB suplente)
Luiz Antônio Ferreira das Neves (BAR suplente)
Esse grupo deu início à proposta de reforma do currículo, reunindo-se em diversas ocasiões, trazendo sugestões quanto às disciplinas consideradas essenciais ao conhecimento de suas áreas de estudo para uma boa formação docente na área artística. Tais sugestões foram extremamente ricas, pois vinham de profissionais atuantes nos vários setores que compõem o fazer artístico e muito contribuíram para a nossa tarefa.
Posteriormente, com a mudança na coordenação, foi incluída a profª Mariane Brito Azevedo Borges, nova coordenadora do curso pela Portaria 8393 de 12/11/2015, publicada no BUFRJ nº 47 em 19/11/2015.
Num outro momento, em reunião do Departamento BAR, o Corpo Deliberativo decidiu alterar a constituição do NDE, concentrando seus membros no próprio departamento para possibilitar uma visão mais específica das questões que envolvem o curso. A nova comissão foi nomeada pela Portaria 5431 de 13/06/2018, publicada no BUFRJ nº 25 em 21/06/2018, com os seguintes componentes:
Anita de Sá e Benevides Braga Delmás
Alvaro José Rodrigues de Lima
Danusa Chini Gani
Glaucia Augusto Fonseca (substituta eventual da coordenação)
Daniel Wyllie Lacerda Rodrigues
Mariane Brito Azevedo Borges (coordenadora do curso no momento da elaboração do PPC)vii.
i A tese desta autora “A construção do Currículo do Curso de Licenciatura em Educação artística: desafios e tensões” está disponível em https://ppge.educacao.ufrj.br/anitasa.pdf.
ii Of. nº3157/82 UFRJ - Este ofício foi expedido em cumprimento à exigência feita pelo Conselho Federal de Educação na tramitação do processo de Reconhecimento do Curso de Licenciatura em Educação Artística. O documento foi localizado na Divisão de Ensino da PR1 – UFRJ.
iii O formato “3+1” corresponde aos cursos, nos quais os alunos cumprem as disciplinas de conteúdo específico nos três primeiros anos, quando, na maioria dos casos, concluem um bacharelado, cursando depois mais um ano na Faculdade de Educação para cumprimento da formação pedagógica e obtenção do grau de licenciado.
iv Anteriormente, desde 1931, quando se incorporou à Universidade do Brasil, a formação de professores restringia-se a professores de Pintura e de Escultura, atividades não escolares.
v Esta expressão usada para designar - a Pintura, a Escultura e a Gravura - refere-se ao fato de serem as formas essenciais de arte, sendo tão comum seu sentido que é assim também designado o Departamento de Artes Base (BAB), onde estão alocados hoje estes três cursos.
vi Consta do Processo de nº 23079.003373/95-69, no qual tramitou a transferência do curso da Faculdade de Educação para o CLA, que a transferência se deu de acordo com a Res. CEG 02/ 94 – Normas para funcionamento dos Cursos de Licenciatura, que estabelece que “o registro do aluno do curso de licenciatura far-se-á na unidade de conteúdo específico”.
vii Atualmente a Licenciatura está dividida em dois cursos: Licenciatura em Artes Visuais e Licenciatura em Expressão Gráfica com coordenações distintas.